Identidades africanas e a gastronomia

A gastronomia africana é rica em temperos e especiarias importantes para dar sabor aos melhores pratos e às diversas receitas feitas pelos povos daquele continente. As pimentas africanas, o cominho, o gengibre e o mbongo são alguns dos vários temperos africanos utilizados. No entanto, ainda não é devidamente reconhecida.  

Um prato muito conhecido em todo o continente africano é o “fufu”, que é feito com farinha de mandioca, milho ou inhame e é consumido em todo o continente. Outro prato muito popular é o “couscous”, que é uma mistura de grãos de sêmola com vegetais e carne, geralmente servido com um molho picante.

Nesta reportagem, apresentamos os testemunhos e histórias de três cozinheiras africanas de diferentes nacionalidades, que partilham as suas experiências  e o valor da comida africana para elas.

Para os povos africanos a comida é vista com respeito e é uma oportunidade de juntar  várias pessoas à volta de um prato ou tigela  e confraternizar ao sabor de especiarias e de fazê-lo com tempo.  

Essa viagem mostrou-me os pontos em comum nos caminhos alimentares da diáspora africana. Por exemplo, a xima é um prato moçambicano feito com fuba moída e  isso faz-me lembrar quando a minha mãe cozinhava fufu, uma farinha de mandioca moída e que durante a sua preparação é  misturada com água quente

 

Margo Gabriel

Margo Gabriel, a jornalista norte-americana, que escreve artigos sobre gastronomia africana na publicação digital Cuisine Noir Magazine, diz-nos que  decidiu viajar pelo mundo e fazer novas descobertas. “Por ser filha de imigrantes haitianos, sempre tive essa curiosidade pelo mundo e aprendi a cozinhar com a minha mãe, Marceline, e a minha irmã mais velha, Elmide, que formaram muito meu paladar. Adoro explorar um lugar que é novo para mim e acredito que a comida é um veículo para aprender sobre culturas diferentes da minha e suas tradições culinárias”, conta Margo.

A escritora norte-americana, lembra ainda que a  primeira vez que visitou o continente africano foi numa viagem a Moçambique, em 2018: “Essa viagem mostrou-me os pontos em comum nos caminhos alimentares da diáspora africana. Por exemplo, a xima é um prato moçambicano feito com fuba moída e  isso faz-me lembrar quando a minha mãe cozinhava fufu, uma farinha de mandioca moída e que durante a sua preparação é  misturada com água quente “, explica. E acrescenta ainda que conhecer os locais, comer marisco fresco, frango com piri piri, pratos de caril, legumes estufados ou carnes grelhadas, é uma experiência que vai recordar por muito tempo. No entanto, nem todos têm acesso a pratos típicos africanos  por causa da falta de um  reconhecimento mais alargado desta gastronomia, que nem sempre se encontra em grandes hotéis, por exemplo. 

Lassiatu Baldé, natural da Guiné-Bissau, onde vive atualmente, também aponta o mesmo aspeto, explicando que durante a sua passagem

 nas cozinhas dos hotéis em Bissau sentiu a falta de pratos tradicionais guineenses. Para além de respeitar a tradição, a chefe Laíssiatu, formada em cozinha orgânica, introduz novos pratos feitos por ela no cardápio da cozinha guineense. Um exemplo é a sua famosa Lasanha de Bagre Fumado, um dos pratos que mais vendeu no seu restaurante, em 2019, em Bissau.

Nem sempre a inovação é reconhecida  na gastronomia africana. Margo Gabriel acredita que, para que a comida africana seja reconhecida a uma escala ainda maior, “devemos também olhar para as práticas de negócios da indústria culinária, que ainda é esmagadoramente homogénea”, uma vez que se baseiam na gastronomia europeia. Daí a especialista em comidas do mundo discutir com frequência tópicos como a intenção das pessoas, a equidade e inclusão quando se trata de um negócio ou de uma nova iniciativa.  

Um dos locais, em Lisboa, onde diversas intenções e novas iniciativas podem ser encontradas e saboreadas é a zona do Martim Moniz. É aí que a chefe Aissatou Lamarana Dialló, da Guiné-Conacri, tem o seu restaurante de comida tradicional africana. Diallo ressalta a importância que a comida tem para diferentes cerimónias, como se verifica em várias partes do mundo, e o continente africano não é diferente.  O prato latchiri, popular entre a etnia fulani, tem como base a farinha de milho verde e é servido com leite de vaca adormecido. Segundo  a Chefe Aissatou Dialló, proprietária do restaurante Aicha African Food, cozinhar latchiri é motivo de orgulho para ela, por ser um prato, que, no seio da comunidade fulani, é escolhido para demonstrar respeito a outras pessoas. Este não é um prato habitualmente consumido no dia a dia, mas, sim, em cerimónias como casamentos ou celebrações do nascimento de crianças. Porém, pratos tradicionais como o caldo de mancarra, não se deixam ficar atrás e é isso que traz o equilíbrio. A cozinheira, sente que tem a responsabilidade de manter a identidade gastronómica no seio da comunidade fulani em Lisboa. 

Se apenas entre uma chefe da Guiné-Bissau, outra da Guiné-Conacri e uma especialista e apaixonada por comidas do mundo vinda da América do Norte, é possível encontrar uma grande variedade de pratos e sabores que refletem as tradições e a criatividade da culinária africana, imaginem o que ainda está por descobrir se nos aventurarmos pelo resto do continente. 

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